quinta-feira, maio 30, 2013

Património silvense (III)




Arte Nova em Silves


Este edifício, no cruzamento da Rua 5 de Outubro com a Travessa do mesmo nome, do lado direito de quem sobe para o Largo do Município, é um edifício singular.

Trata-se de um exemplar, único em Silves,  da corrente estética que vigorou dos finais de oitocentos a início de novecentos, designada como Arte Nova - Art Nouveau - com particular expressão na arquitetura, na decoração de interiores e no mobiliário.
 
 
 
 
É o seu solário, o elemento que melhor documenta essa opção estética.
 
 
  
 
Em conversa com os atuais proprietários e anteriores residentes não me foi possível saber o ano em que se erigiu este edifício, nem o nome do seu primeiro proprietário.
 
Pelas diferentes características que apresenta em relação a outros prédios oitocentistas da mesma rua, leva-me a situar a sua construção como mais tardia, talvez durante o primeiro quartel do séc. XX.
 
Aqui viveu o Dr. Nobre de Oliveira, médico, de boa memória.

Hoje é propriedade da Família Guerreiro, que detém a farmácia com o mesmo nome no rés-do-chão do edifício.
 
  O Dr. Guerreiro, já falecido, farmacêutico e proprietário deste prédio, usou de todo o seu cuidado nos trabalhos de restauro, nomeadamente no belo friso de azulejos coloridos, tendo mandado produzir alguns novos que houve necessidade de repor, pois a série já se encontrava obviamente esgotada ao fim de tantos anos.
 

Aqui deixo um pormenor do friso.
 
Este prédio é um dos mais elegantes e dos melhor conservados desta rua, que tem, pelo menos no seu primeiro troço, alguns dos mais característicos edifícios da cidade.
 
 
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Edições anteriores:
 
Património silvense (I)  - Claustro interior nos Paços do Concelho

Património silvense (II) - Igreja da Misericórdia
 
 
 


segunda-feira, maio 27, 2013

Um poema de Francisco José Viegas























     As crianças adoecem no Inverno,
     tossem de noite,
     morres por elas nesses momentos
     em que precisam de ti.

     Vigias o seu sono,
     entregas o teu, despertas com facilidade,
     olhas uma a uma as horas que passam
     como se todas as crianças nascessem no Inverno.


Francisco José Viegas
O Puro e o Impuro, 2003
 
 
 

quinta-feira, maio 23, 2013

Silves, ao tempo da civilização do al-Ândalus (III)




Foto batida por ocasião da Feira Medieval de Silves, edição de 2009.


Esta foto é meramente decorativa.
A "Barca Arade" funciona no rio Arade, transportando turistas rio acima, até Silves, e seu regresso a Portimão.
Quando o seu proprietário, João Venâncio,  começou aqui a operar, por finais dos anos 80, contou-me que este modelo de barco lhe tinha sido sugerido por responsáveis do Museu da Marinha, nos Jerónimos, como o tipo de embarcação que aqui deveria usar-se ao tempo da presença muçulmana.

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(III)


A Bakr Ibn Iahia, do episódio anterior, sucedeu o seu filho Qalaf Ibn Bakr.

Qalaf foi um resistente às intenções do, ao tempo,  emir 'Abd ar-Rahman III, que chegou mesmo a cercar Ossónoba (Faro, na atualidade), onde teria encontrado grandes tesouros reunidos por Qalaf, que se refugiara em Silves.

Na sequência do cerco, o príncipe de Silves e Ossónoba, enviou parlamentares junto do emir, sugerindo que se o aceitasse como senhor do Gharb, ele lhe prestaria vassalagem.

'Abd ar-Rahman aceitou, dado o grande prestígio moral e intelectual de que gozava no Ocidente o Príncipe Qalaf Ibn Bakr, que se distinguiu particularmente pela sua proteção aos cristãos que se deslocavam em número significativo aos santuários de Santa Maria (atual Faro) e São Vicente, no cabo do mesmo nome.

'Abd ar-Rahman veio a tornar-se califa, como sabemos já do episódio anterior e a dominar todo o Gharb.

Qalaf continuou senhor do Gharb mesmo após a morte do califa.

Em 966 (AD), era califa Al-Hakam II e Qalaf ainda mantinha o seu poder na região.

Foi por esta ocasião que se deu uma terceira invasão dos normandos (majus ou vikings), contra as costas ocidentais da Península Ibérica.

Repelidos os primeiros ataques na Galiza, os normandos desceram até Lisboa onde travaram uma batalha, fazendo numerosos prisioneiros.

Al-Hakam II, conhecedor destas incursões, preparou uma esquadra que saiu de Sevilha ao encontro dos piratas, que traziam 28 navios de alto bordo e 2500 homens de armas.

O combate travou-se no rio de Silves, o Arade.

Qalaf terá participado no recontro com operações terrestres conjugadas ou mesmo com navios que houvesse no porto, refere Garcia Domingues.

Dozy, historiador, refere, nas suas Recherches,  que "os normandos foram completamente derrotados pela esquadra muçulmana que libertou os prisioneiros muçulmanos e cristãos feitos em Lisboa e se encheu de glória".

Diz Garcia Domingues: "Os grandes assaltos normandos que durante tanto tempo aterraram a Espanha árabe, vieram pois a ser sufocados nessa batalha célebre, travada nas águas do Arade, o que constitui sem dúvida mais um motivo de justo orgulho da Silves arábica."

Este episódio, que ocorreu em 966 (AD), ficou conhecido como Batalha Naval do Arade.

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Garcia Domingues, História Luso-Árabe, edição do Centro de Estudos Luso-Árabes de Silves, 2010
António Borges Coelho, Portugal na Espanha Árabe, vol. 2 - Editorial Caminho

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Se estiver interessado na leitura dos episódios anteriores, siga os links abaixo:

Silves, ao tempo da civilização do al-Ândalus (I)

Silves, ao tempo da civilização do al-Ândalus (II)




segunda-feira, maio 20, 2013

Padre António Vieira em carta a D. João IV




A estatística do "blogger" vem revelando uma procura inusitada de um texto do Padre António Vieira, aqui publicado em Fevereiro de 2007.

Presumo que este texto reflita algo que na nossa atual situação tenha merecido uma atenção particular.
Aqui o reproduzo, visando chegar a mais leitores:









Há homens que veem para além do seu tempo.




Trago-vos hoje um texto de Padre António Vieira, mais exatamente o excerto de uma carta que, do Maranhão, no Brasil, dirigiu ao rei D. João IV, com data de 20 de Maio de 1653:








  • [...] Os índios que moram em suas aldeias com títulos de livres são muito mais cativos que os que moram nas casas particulares dos portugueses, só com uma diferença, que cada três anos têm um novo senhor, que é o governador ou capitão-mor que vem a estas partes, o qual se serve deles como de seus e os trata como alheios; em que vêm a estar de muito pior condição que os escravos, pois ordinariamente se ocupam em lavouras de tabaco, que é o mais cruel trabalho de quantos há no Brasil. Mandam-nos servir violentamente a pessoas e em serviços a que não vão senão forçados, e morrem lá de puro sentimento; tiram as mulheres casadas das aldeias, e põem-nas a servir em casas particulares, com grandes desserviços de Deus e queixas de seus maridos, que depois de semelhantes jornadas muitas vezes se apartam delas; não lhes dão tempo para lavrarem e fazerem suas roças, com que eles, suas mulheres e seus filhos padecem e perecem; enfim, em tudo são tratados como escravos, não tendo a liberdade mais que no nome, pondo-lhes nas aldeias por capitães alguns mamelucos ou homens de semelhante condição, que são os executores destas injustiças, com que os tristes índios estão hoje quase acabados e consumidos; [...]
    As causas deste dano bem se vê que não são outras mais que a cobiça dos que governam, muitos dos quais costumam dizer que V.M. os manda cá para que se venham remediar e pagar de seus serviços, e que eles não têm outro meio de o fazer senão este. [...]


História e Antologia da Literatura Portuguesa (Séc. XVII), nº 36
Fundação Calouste Gulbenkian
Serviço de Educação e Bolsas

sexta-feira, maio 17, 2013

Hoje quero homenagear um poeta


Quero homenagear o segundo poeta português a obter o prémio ibero-americano de poesia  "Rainha Sofia".

Nuno Júdice
 
Foto de "El País"
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Quem o antecedeu foi a saudosa Sophia de Mello Breyner Andresen.
 
 
A melhor homenagem que me ocorre é a de divulgar a sua poesia. Com vossa licença, é o que irei fazer.
 
 
 
               .   POEMA
 
          As coisas mais simples, ouço-as no intervalo
          do vento, quando um simples bater de chuva nos
          vidros rompe o silêncio da noite, e o seu ritmo
          se sobrepõe ao das palavras. Por vezes, é uma
          voz cansada, que repete incansavelmente
          o que a noite ensina a quem a vive; de outras
          vezes, corre, apressada, atropelando sentidos
          e frases como se quisesse chegar ao fim, mais
          depressa do que a madrugada. São coisas simples
          como a areia que se apanha, e escorre por
          entre os dedos enquanto os olhos procuram
          uma linha nítida no horizonte; ou só as
          coisas que subitamente lembramos, quando
          o sol emerge num breve rasgão de nuvem.
          Estas são as coisas que passam, quando o vento
          fica; e são elas que tentamos lembrar, como
          se as tivéssemos ouvido, e o ruído da chuva nos
          vidros não tivesse apagado a sua voz.
 
 
Nuno Júdice
As Coisas Mais Simples, 2006
 
 
 
 
 


quinta-feira, maio 16, 2013

Quando a cor toma conta da cidade




Foto batida em Outubro de 2011, por ocasião de uma competição internacional de canoagem.



Quando a cor toma conta da cidade, uma certa embriaguez toma conta de mim.

Flutuo, como num voo alado, sem sair donde me quedo.

A alegria enche-me o peito e choro um riso que não é de dor nem de alegria, mais de contemplação que de prazer.



segunda-feira, maio 13, 2013

Os mais vistos de sempre


 
 
 
Um dos "posts" mais vistos de sempre no Local & Blogal foi publicado a 6 de Abril de 2004 sob o título "A Rapariga com Brinco de Pérola".
 
E era assim:


A rapariga com brinco de pérola
 
 
http://www.girlwithapearlearringmovie.com



A surpresa da luz natural.
Avistei-a domingo à noite na sala 7 do Algarve Shopping.
Serena e lânguida. Longa como o tempo que passa devagar e nos apetece reter. Ficou comigo até agora.
Por quanto tempo mais conseguirei mantê-la afastada daquela zona cobiçosa da minha mente, continuamente ávida de novas impressões?!



quinta-feira, maio 09, 2013

ESPLANADA, de Manuel António Pina




Foto batida em Serralves, Porto


Esplanada

Naquele tempo falavas muito de perfeição,
da prosa dos versos irregulares
onde cantam os sentimentos irregulares.
Envelhecemos todos, tu, eu e a discussão,

agora lês saramagos & coisas assim
e eu já não fico a ouvir-te como antigamente
olhando as tuas pernas que subiam lentamente
até um sítio escuro dentro de mim.

O café agora é um banco, tu professora de liceu;
Bob Dylan encheu-se de dinheiro, o Che morreu.
Agora as tuas pernas são coisas úteis, andantes,
e não caminhos por andar como dantes.


Manuel António Pina
UM SITIO ONDE POUSAR A CABEÇA, 1991
 
 
 
 

segunda-feira, maio 06, 2013

Património silvense (II)




A Igreja da Misericórdia







Face à fachada ocidental da Sé Catedral de Silves e ao seu pórtico ergue-se a...











... Igreja da Misericórdia (séc. XVI).






Os templos cristãos são habitualmente orientados no sentido ocidente-oriente, com o altar do lado oriental, como acontece com a Sé.

No caso da Igreja da Misericórdia de Silves a orientação segue a linha sul-norte, com o altar do lado norte.

Daí que o Pórtico da Sé confronte a fachada lateral da Igreja da Misericórdia, que ostenta uma bela Porta Manuelina, que mais parece uma grande janela, dado o seu desnivelamento em relação à rua.

 
 




O seu pórtico, renascentista, abre-se a sul...











... dando acesso uma única nave, abobadada.






No topo, o altar-mor, com um retábulo maneirista.



O painel central representa o que julgo ser a visita de Maria, grávida, a sua prima Isabel.

Os painéis que o cercam descrevem as "Obras de Misericórdia Corporais", à exceção do painel superior, que se refere à Crucificação.


Houve, em tempo, pequenos painéis, com motivos da Via Sacra, que usualmente saíam à rua na noite de Sexta-feira Santa, no "Enterro do Senhor".

Depois do restauro, que contemplou também o retábulo, executado pelas oficinas da Fundação Ricardo Espírito Santo, por pouco tempo mais voltaram a ficar expostos em público.



Hoje, a Igreja da Misericórdia, desativada para o culto, e património da Santa Casa da Misericórdia, serve no fundamental como galeria de arte.

Seguem-se três fotografias com pormenores do templo.


 
 
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Edição anterior:
 
Património silvense (I)  - Claustro interior nos Paços do Concelho
 

quinta-feira, maio 02, 2013

Memórias do blogue




Este blogue irá cumprir dez anos no decurso deste ano de 2013.

Proponho-me trazer aqui, de vez em quando, alguns dos meus textos de 2003 menos marcados pelo tempo.


Como uma almenara


Foto batida em Tavira, em Agosto de 2003
 
 
Erguida como uma almenara vigilante, preservando memórias que permanecem em chapadas de cal contra o azul resplandecente do céu.