quinta-feira, dezembro 20, 2007

A Paz é um processo de conflito

É para essa conflitualidade que vos quero chamar a atenção neste período de entorpecimento morno e balofo, tão característico desta febre consumista que só não esquece o próximo por "caridade", tão ávidos andamos na busca da "paz, da felicidade e da harmonia".
          - O que é preciso é sorrir, não é? Rir faz bem. Não me venhas para cá com tristezas!

O primeiro testemunho é de um poeta e amigo, a quem pedi para transcrever este seu poema:


  • Por muito que renasças e redigas
    tudo quanto disseste há dois mil anos,
    por muito que, por cima das intrigas,
    das falsidades e dos desenganos,
    a tua voz de novo se levante
    e fira os vendilhões e os tiranos,
    por muito que, outra vez, o galo cante,
    anunciando a luz de mais um dia,

    o presépio que o mundo te há-de dar
    esconderá sempre, implacável e fria,
    a cruz em que te vai crucificar.

Torquato da Luz

O segundo testemunho é de um músico e cantor que muito prezo e que embora neste seu trabalho se refira à realidade do seu país, reflecte bem a influência do meio social e as grandes divisões e conflitos instalados na sociedade.

Nota:
O título da canção - O Herói - de Caetano Veloso, vem adulterado pela ausência do ó (acentuado), pois em locais de expressão anglo-saxónica estes símbolos gráficos não existem.


Saibamos manter os olhos abertos para o que nos rodeia e... até 2008, muito provavelmente!

segunda-feira, dezembro 17, 2007

Concurso do Local & Blogal

Decorreu mais um concurso do Local & Blogal, cuja intenção foi a de promover o património da cidade onde vivo, através da participação activa dos seus leitores, enquadrando-o nas tendências estéticas da época e projectando a sua matriz local num enquadramento mais vasto.

O concorrente vencedor identificou as duas cidades a que se reportam as imagens, Silves e Sevilha e, embora com alguma justificável indecisão, sobre essas duas imagens escreveu assim:

  • Foto nº 1 - Silves. Arcaria em volta inteira de gosto eclético, predominantemente mudéjar, suportada por colunas de ferro fundido realizadas na Fábrica das Devezas (Gaia) e pagas por Gregório Mascarenhas, industrial corticeiro e presidente da câmara por duas vezes nesta época. A influência decorativa neo-árabe está sobretudo presente na decoração estucada dos alfizes e nos alçados do zimbório que é rematado por clarabóia, assim como no friso que rodeia superiormente a galeria. É obra realizada provavelmente na última década do séc. XIX, princípios do séc. XX, no edifício destinado a ser os Paços do Concelho de Silves (Algarve, Portugal).

  • Foto nº 2 - Talvez Sevilha. Mas é plano difícil, muito fechado. É obra de tipo andaluz, sevilhano provavelmente. Novamente de gosto ecléctico, misturando elementos decorativos de influência islâmica e renascentista, fazendo utilização decorativa do azulejo tipo sevilhano, do estuque e do ladrilho hidráulico de cor verde e branca (tudo elementos decorativos de utilização na arte islâmica). A par de pormenores de tradição andaluza, como o ferro forjado. Se for edifício sevilhano, não me admirava nada que se tratasse de um pormenor do palácio neo-mudéjar, hoje Museu das Artes e Costumes Populares, no Parque Maria Luísa ou até um dos Pavilhões das redondezas, construídos propositadamente para a Feira Ibero-Americana de Sevilha em 1929, como é o caso do pavilhão português. Mas como já referi, o plano é muito apertado, podendo ser um revivalismo actual, em qualquer cidade andaluza!


Capa que antecede o Foral Manuelino de Silves

O vencedor, Manuel Francisco Castelo Ramos, Mestre em História de Arte, professor, director do Museu da Cortiça da Fábrica do Inglês, vereador não permanente da Câmara Municipal de Silves e que me concede a honra de ser meu amigo, já vencedor de um anterior concurso, aqui e aqui, nos mesmos moldes, irá receber como prémio uma edição dos Forais de Silves (Foral Afonsino de 1266, Foral dos Mouros Forros de Silves, Tavira, Loulé e Santa Maria de Faro, de 1269, e Foral Manuelino de 1504), de onde retirei a imagem acima, que serve de capa ao exemplar manuscrito e iluminuras do Foral Manuelino.

Notas:
1. Quero esclarecer que o edifício a que se refere a foto nº 2 é, precisamente, o que, do lado direito, abre a Avenida de la Constitución, em Sevilha, para quem, a partir do Ayuntamiento se dirija para a Catedral.
2. Resta-me ainda agradecer a todos os que se dispuseram a concorrer, nomeadamente a Filipe Rodrigues, que acertou nas duas cidades e também apresentou uma curiosa e adequada descrição do estilo e época dos edifícios.
3. Mais fotos que bati em Sevilha podem ser encontradas aqui.

quarta-feira, dezembro 12, 2007

Só. No silêncio

©António Baeta Oliveira

 

 


De onde estou, ouço o rolar dos carros que passam, os saltos altos de uma mulher na calçada, o arfar pesado de um idoso que sobe a rua e, escuta...

... o chilrear de um pássaro.

segunda-feira, dezembro 10, 2007

Cidades do Sul

1.

Este fim-de-semana detive-me em duas cidades do Sul da Península, como estas duas fotos documentam.

2.



De que cidades se trata?
Convido-vos a participar num concurso que consiste em acertar nessas duas cidades e acrescentar uma pequena descrição que se refira ao estilo e época dos edifícios.

Quem acertar nas duas cidades e apresentar a descrição que eu vier a julgar como a mais correcta e elegante, receberá um prémio.

Notas:
I. A descrição solicitada só serve como factor de desempate (se houver um só concorrente a nomear correctamente as duas cidades, ele será o vencedor, ainda que não apresente nenhuma referência a estilo e época).
II. O prazo de resposta encerra às 00h00 do dia 15 (sábado) e as respostas deverão ser enviadas para aqui (clique), mencionando no assunto - Concurso Local & Blogal
.

quarta-feira, dezembro 05, 2007

Ensina-me a sonhar

Praia da Galé, Dezembro 2007, © António Baeta Oliveira
Mamã!
Deixa de olhar o mar, brinca comigo.
Ensina-me a sonhar, abre as asas do meu voo.

segunda-feira, dezembro 03, 2007

A crítica do Romantismo

Na passada sexta-feira passou mais um ano sobre o dia da morte de Pessoa (30.Nov.1935).
Como sucedeu levar comigo, num passeio que dei junto à areia da praia, o Livro do Desassossego, de Bernardo Soares (heterónimo de Pessoa), e a leitura de um dos seus escritos, que abaixo transcrevo, me ter inspirado a foto abaixo, resolvi partilhar convosco esta reflexão do poeta.

Dominando o mar, Dezembro 2007, © António Baeta Oliveira


  • A personagem individual e imponente, que os românticos figuravam em si mesmos, várias vezes, em sonho, a tentei viver, e, tantas vezes, quantas as tentei viver, me encontrei a rir alto, da minha ideia de vivê-la. O homem fatal, afinal, existe nos sonhos próprios de todos os homens vulgares, e o romantismo não é senão o virar do avesso do domínio quotidiano de nós mesmos. Quase todos os homens sonham, nos secretos do seu ser, um grande imperialismo próprio, a sujeição de todos os homens, a entrega de todas as mulheres, a adoração dos povos, e, nos mais nobres, de todas as eras... Poucos como eu habituados ao sonho, são por isso lúcidos bastante para rir da possibilidade estética de se sonhar assim.

    A maior acusação ao romantismo não se fez ainda: é a de que ele representa a verdade interior da natureza humana. Os seus exageros, os seus ridículos, os seus poderes vários de comover e de seduzir, residem em que ele é a figuração exterior do que há mais dentro na alma, mas concreto, visualizado, até possível, se o ser possível dependesse de outra coisa que não o Destino.


Bernardo Soares
(Fernando Pessoa)
Livro do Desassossego
Assírio & Alvim, Lisboa 2005