sexta-feira, abril 30, 2010

LINNEU



  • LINNEU

    para a Sophia


    A minha profissão é dar-lhes nomes.
    Tal como o outro, passados os seis dias,
    foi tudo achando bem, e disse
    que era bom, e o chamou,
    assim, no bom ou mau,
    eu dou nomes à vida, digo
    esta é a rosa dos ventos, digo
    esta é a flor das águas, digo
    esta é a planta do teu pé.

    Apenas digo nomes: tudo existe
    muito senhor de si,
    tudo existe insolente,
    independente.

    Não era necessário eu ter nascido.

Pedro Tamen
Analogia e Dedos, 2006
Poemas Portugueses - Antologia da Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI
Porto Editora, Lda., Porto, 2009

quarta-feira, abril 28, 2010

Monólogo e Explicação


http://www.google.pt/imgres?imgurl=http://nescritas.com/poetasapaixonados/listapoesiasdeamor/imagens/fernando_assis_pacheco.jpg&imgrefurl=http://nescritas.com/poetasapaixonados/listapoesiasdeamor/1973/02/&h=200&w=165&sz=14&tbnid=RYLjtsjuIilN8M:&tbnh=104&tbnw=86&prev=/images%3Fq%3D%2522Fernando%2BAssis%2BPacheco%2522&hl=pt-PT&usg=__aHQQk_SLZWmGObckzZ-DGxqZh6s=&ei=ls_VS4neF9PI_gafxOjXDw&sa=X&oi=image_result&resnum=11&ct=image&ved=0CCMQ9QEwCg
Conhecia o Fernando Assis Pacheco dos jornais e o da literatura, embora este um pouco tarde, pouco tempo antes da sua morte, em Trabalhos e Paixões de Benito Prada, esse romance inquietante, de violência justificada na defesa da honra, numa Galiza a que estava vinculado pelo seu avô Santiago.
À sua poesia nunca antes acedera.
Tomei contacto com ela agora, durante a IV Bienal de Silves, e apresso-me a divulgá-la.

  • Monólogo e Explicação

    Mas não puxei atrás a culatra,
    não limpei o óleo do cano,
    dizem que a guerra mata: a minha
    desfez-me logo à chegada.

    Não houve pois cercos, balas
    que demovessem este forçado.
    Viram-no à mesa com grandes livros,
    com grandes copos, grandes mãos aterradas.

    Viram-no mijar à noite nas tábuas
    ou nas poucas ervas meio rapadas.
    Olhar os morros, como se entendesse
    o seu turpor de terra plácida.

    Folheando uns papéis que sobraram
    lembra-se agora de haver muito frio.
    Dizem que a guerra passa: esta minha
    passou-me para os ossos e não sai.

Fernando Assis Pacheco
Câu Kiên: Um Resumo, 1972
Poemas Portugueses - Antologia de Poesia Portuguesa do Séc. XIII ao Séc. XXI
Porto Editora, Lda., Porto, 2009

segunda-feira, abril 26, 2010

IV Bienal de Poesia de Silves (momentos que destaco)



Destaco o momento da homenagem a Fernando Assis Pacheco e à sentida comunicação do seu amigo e poeta Luís Serrano.

(A criança que ladeia Luís Serrano, no momento da sua comunicação, é o neto do homenageado)



Destaco também outra homenagem, a Pedro Tamen, pela sua obra, em conferência proferida por Maria do Sameiro Barroso, com apoio à declamação por parte do actor Paulo Moreira.

(De pé, na foto, Gabriela Martins, a alma desta bienal, já na sua 4ª edição)


Bem hajas, Gabriela!

quinta-feira, abril 22, 2010

IV Bienal de Poesia de Silves


IV Bienal de Poesia de Silves
A partir de hoje e ao longo do fim-de-semana a poesia assentará arraiais em Silves.

Aconselho, desde já, a descarregar o programa oficial (clique).

Pode ainda inteirar-se mais aprofundadamente do que se irá passar através do blogue associado ao evento, em IV Bienal de Poesia de Silves (clique).

Agora, informado, está nas suas mãos a decisão.

Eu irei lá estar, na Biblioteca Municipal.

quarta-feira, abril 21, 2010

Quando tudo se ajusta


Escadaria que sobe do Largo do Muncípio até aos Paços do Concelho. Silves, Abril 2010
Quando tudo se ajusta e se equilibra, e algo de estranho se introduz fugazmente na aparente imobilidade da paisagem, há lugar ao espanto, quando não à estupefação ou ao milagre. :)

segunda-feira, abril 19, 2010

Que viva a viagem!


Cegonhas no ninho, Silves, Abril 2010
Quando a atenção se concentra no nosso pequeno mundo, perde-se o sentido do todo; a universalidade cede o lugar ao provincianismo.
Que viva a viagem!

quinta-feira, abril 15, 2010

Expressividades em mundos virtuais


Uma vez mais, a Galeria LX, no mundo virtual da Second Life, abre uma nova exposição a partir das 22 horas do próximo 18 de Abril.
ling Serenity é o avatar de Melina Moreno, francesa de nascimento e artista plástica de formação académica na vida real, que aqui se expressa através de pequenas bonecas inspiradas na manga japonesa.


(Recomendo que usem o ícone que faculta uma visão em ecrã inteiro)
(Para sair basta premir a tecla Esc)



quarta-feira, abril 14, 2010

Há velhos ao Sol nos bancos dos jardins


Velhos ao Sol, Silves, Abril 2010
Eu sei que nasci num país onde os velhos são deixados nos bancos dos jardins.
Sei que mal sei aparelhar as letras para uma leitura em que entenda o que está escrito no jornal.
Sei que a reforma me vai dando para comer e para um cigarrinho, mas receio uma doença e não tenha dinheiro para os remédios.
Sei que a família me vê como um estorvo e me trata como uma criança, apesar da sinceridade do amor que têm por mim.
Mas, amigo, ainda gosto de sorrir à vida de cada vez que, pela manhã, ponho os pés assentes no chão e me firmo em pé.

segunda-feira, abril 12, 2010

Ciclo Persona na Biblioteca Municipal (III sessão)


Paulo Pires, Irene Pimentel e José Louro. Bilioteca Municipal de Silves. Abril 2010
Esta terceira sessão foi dedicada a Zeca Afonso.

Paulo Pires, animador destas sessões, moderou o debate.

Irene Pimentel, investigadora de História Contemporânea e autora do livro JOSÉ AFONSO, edição do Círculo dos Leitores, na colecção Fotobiografias do Século XX, referiu-se a aspectos da vida e obra de Zeca, com a serenidade e o à-vontade de uma investigadora que sabe bem do que fala, numa proximidade muito grande junto de um público muito diversificado e com diferentes expectativas face à personalidade aqui homenageada, de certa maneira.

José Louro, conhecido homem do teatro nesta nossa região e que de perto privou com Zeca no período em que ele aqui viveu, na cidade de Faro, revelou episódios bem característicos da personalidade do homenageado, com muita graça e muito respeito por este seu amigo.

A Ricardo Martins e à sua banda, recentes finalistas da última edição do Festival da Canção, coube a responsabilidade musical.
Nada tenho a apontar em particular à execução dos temas, mas o tratamento dado às canções não faz muito o meu gosto: alguma ligeireza em temas muito fortes como em "os vampiros", toadas demasiado "adocicadas" em temas mais líricos, um ritmo de música de dança a espelhar um pouco um Zeca já institucionalizado, onde o que diz e proclama já não provoca contestação, como se todos já estivéssemos de acordo quanto à visão deste mundo que nos rodeia.

Mas Zeca provoca festa e quando há festa eu também lá estou, emprestando o meu entusiasmo.

Ficam as visões do mundo para outras tertúlias e outras sessões deste ciclo, muito provavelmente já na próxima sessão, com Vera Mantero a interpretar Caetano Veloso.

quinta-feira, abril 08, 2010

Tal como nós...


Um telhado em Lagos, ao entardecer. Março 2010
            ...há uns que reservam bem cedo um poiso seguro antes que a noite caia, outros há que preferem beber a vida até à última gota.

terça-feira, abril 06, 2010

Romance Popular


Esta melhoria do tempo, este acalentar do Sol, estes dias cheios de luminosidade, a exuberância da Natureza, o verde que tudo cobre depois de um prolongado tempo de chuva, o matizado das flores sobre esse tapete verde, até mesmo o incómodo de uma alergia que nunca antes sentira, são sinais de que por este meu Algarve há vida que vive intensamente.

Queria trazer-vos algo de genuinamente algarvio e deparei-me com...

Estácio da Veiga (séc.XIX), figura incontornável da arqueologia nacional, que dedicou algum do seu tempo à recolha do romanceiro popular.

Transcrevo um dos seus romances, mantendo a ortografia original:

  • A Moira Encantada

    Meia noite além resôa
    Cêrca das ribas del mar,
    Meia noite já é dada
    E o povo ainda a folgar.
    Em meio de tal folguedo
    Todos quedam sem fallar,
    Olhos voltam ao castello
    Para ver, para avistar
    A linda moira encantada,
    Que era triste a suspirar.

    -Quem se atreve, ái quem se atreve
    Ir ao castello e trepar
    Para vencer lo encanto
    Que tanto sabe encantar?
    - Ninguem ha que a tal se atreva,
    Não ha que em moiras fiar;
    Quem lá fôsse a taes deshoras
    Para só desencantar,
    Grande risco assim corrêra
    De não mais de lá voltar.
    - Ái que linda formusura,
    Quem a poderá salvar!
    O alvor dos seus vestidos
    Tem mais brilho que o luar!
    Dôces, tão dôces suspiros
    Onde ouvi-los suspirar?

    Assim um bom cavalleiro
    Só se estava a delatar,
    Em amor lhe ardia o peito,
    Em desejos seu olhar.
    Tres horas eram passadas
    Neste continuo anciar.
    Cavalleiro de armas brancas
    Nunca soube arreceiar:
    Invoca a linda moirinha,
    Mas não ouve o seu fallar.
    Nada importa a D. Ramiro
    Mais que a moira conquistar;
    Vai subir por muro acima,
    Sente os pés a resvalar!
    Ái que era passada a hora
    De a poder desencantar!

    Já lá vinha a estrella d'alva
    Com seus brilhos a raiar;
    No mais alto do castello
    Já mal se via alvejar
    A fina branca roupagem
    Da linda filha de Agar.
    Ao romper do claro dia,
    Para bem mais se pasmar,
    Sobre o castello uma nuvem
    Era apenas a pairar.
    Jurava o povo, jurava,
    E teimava en affirmar,
    Que dentro daquella nuvem
    Vira a donzellinha entrar.
    Dom Ramiro d'enraivado
    De não lhe poder chegar,
    Dalli parte, e contras os moiros
    Grande briga vai armar.
    Por fim ganha um bom castello,
    Mas... sem moira para amar.

Estácio da Veiga
A moira Encantada, Romanceiro do Algarve, Imp.
Joaquim Germano de Sousa Neves, Lisboa 1870

ALGARVE todo o mar
(Colectânea)
Adosinda Providência Torgal
Madalena Torgal Ferreira

DOM Quixote, Lisboa 2005