terça-feira, janeiro 10, 2006

Retrato com vidro embaciado

  • Retrato com vidro embaciado

    Talvez um resto de palavras se apague
    no cinzeiro do tempo: o que me disseste,
    em tardes sem fim, e o murmúrio que sobra
    da noite. Mas isso é o menos: só
    importa esta imagem sem aparência visível,
    este corpo sem espessura nem rosto,
    esta taça sem o vinho de uma libação,
    - os dons indesejados que a vida acumula,
    como um leito de rio quando seca,
    ou o olhar que trocamos, por acaso,
    numa coincidência de espelho.

Nuno Júdice
Um canto na espessura do tempo (1992)
Poesia Reunida (1967-2000)
Dom Quixote, Lisboa, 2000

P.S.
Há mais, de Nuno Júdice, ao fundo da página.

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