Dez anos passaram sobre o falecimento de David Mourão Ferreira.
Não vos venho falar da sua morte, mas da sua vivacidade.
- Ternura
Desvio dos teus ombros o lençol,
que é feito de ternura amarrotada,
da frescura que vem depois do sol,
quando depois do sol não vem mais nada...
Olho a roupa no chão: que tempestade!
Há restos de ternura pelo meio,
como vultos perdidos na cidade
onde uma tempestade sobreveio...
Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo...
Mas ninguém sonha a pressa com que nós
a despimos assim que estamos sós!
David Mourão Ferreira
Obra Poética (1948-1988)
Editorial Presença, Lisboa 1988
7 comentários:
Um dos mais belos poemas do David, de cuja amizade sinto cada vez mais a falta.
Dez anos passaram. Nem dá para acreditar que há tanto tempo.
Nenhuma surpresa tive ao voltar a este blogue e vê-lo cada vez mais dado a postages de excelência, como esta acerca do poeta David Mourão Ferreira, de quem eu lera "Entre a Sombra e o Corpo" (1980) e "O Corpo Iluminado" (1987).
Felicito-o também pela homenagem à pianista Maria João Pires, cuja interpretação de Chopin nivela-se, entre nós aqui no Brasil, às de Arthur Moreira Lima e Nelson Freire.
Obrigado pela simpatia do comentário.
bela homenagem.
beijos e bom domingo
Belo poema sentido de um poeta sensível. Dez anos, já ! Parabéns por ir recordando aqueles que da lei da morte se livraram...mas que os homens, hoje, vão esquecendo.
Abraço,
fsm.
"que da lei da morte se livraram " - perdão : "se vão libertando "
fsm
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