Nos anos 50 do século passado, que venho a recordar nesta memória de afetos, a vida social tinha lugares marcadamente diferenciados para cada camada socioeconómica: uns frequentavam determinados lugares que outros evitavam por motivações de ordem social. No entanto, havia um lugar de partilha comum - a Sociedade Recreativa Alcantarilhense (na foto, casa vermelho escuro à esquerda).
Os bailes: os de Carnaval, o da Pinha, creio que por ocasião da Páscoa, ou o 31 de Janeiro, da revolta republicana do Porto, eram os grandes momentos societários comuns, se não mencionarmos as festas religiosas ou o cinema no armazém do Zé de Almeida, na rua do Moinho de Vento.
Ao final do dia o ponto de encontro das classes menos abastadas era na taberna/mercearia do Constantino da Sofia.
Recordo bem a cisterna, logo à entrada sobre o lado esquerdo, e particularmente os pirolitos que aí refrescavam durante o tempo quente.
O pirolito era a designação atribuída a uma bebida doce, gaseificada, que era fechada por um berlinde de vidro, sob pressão, e de saída condicionada por uma anilha de borracha. Para abrir o pirolito era costume usar-se o carrinho de um torçal de linha, ao qual se desbastava uma das extremidades. Com ele se pressionava o berlinde, abrindo o acesso ao saboroso e fresco conteúdo.
Isto narrado do meu ponto de vista.
Do ponto de vista dos adultos, a cisterna também refrescava o vinho das garrafas que, ao copo, era servido ao balcão.
Do balcão também nos aproximávamos para comprar rebuçados que continham cromos. Lembro particularmente os dos jogadores de futebol e os de uma outra coleção com os reis e rainhas de Portugal, de que tenho uma história com o meu irmão Zé, que espero ter oportunidade de vir a contar (não agora para não me dispersar).
Deste lugar frente ao Constantino recordo também ter avistado um fenómeno meteorológico pouco comum em regiões tão a sul, como o Algarve ou mesmo Portugal. Lembro-me do meu pai me ter pegado ao colo e indicar-me no céu o que designou por aurora boreal. Reconheço vagamente ter avistado cores, mas não entendi o porquê de tanto entusiasmo.
Pelos meus 10 anos, a 2 de Fevereiro de 1954, também assisti a outro fenómeno meteorológico pouco comum, desta vez muito emocionado - uma queda de neve em Alcantarilha, que atingiu uma altura bem significativa.
Outro lugar de encontro ocorria neste edifício, na porta lá mais ao fundo, que dava entrada para a loja do Sr. Sequeira, o responsável local pelo Registo Civil.
Ao balcão juntavam-se as pessoas mais abastadas ou de mais elevado nível de instrução, como os médicos, havia dois em Alcantarilha, proprietários rurais, professores... e, creio eu, pois era bem miúdo para entender e eram tempos conturbados politicamente, falar-se-ia de política ou das novidades dos jornais e da rádio.
Eu também não perdia, às 7 da tarde de cada sábado, com o ouvido encostado ao rádio do Sr. Sequeira, os contos de, se bem me lembro, Álvaro Benamor.
Esta porta e estes degraus eram o lugar da mesma tertúlia política, à noite, quando vinha o tempo mais quente.
Aí o auditório era maior, pois vinham de férias muitos dos proprietários absentistas que viviam fora de Alcantarilha, mas procuravam aqui a proximidade do mar, em Armação de Pera.
Recordo nesta tertúlia o Sr. Ramalho, o do Palacete, que, contrariando as tendências mais situacionistas, prometia ao meu irmão Zé umas calças vermelhas se ele proclamasse bem alto um "Viva a República!".
Recordo nesta tertúlia o Sr. Ramalho, o do Palacete, que, contrariando as tendências mais situacionistas, prometia ao meu irmão Zé umas calças vermelhas se ele proclamasse bem alto um "Viva a República!".
(Tem continuação)
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1 comentário:
Bem eu dos 50s somente cheiguei la em 58/59, mas lembro-me bem de tudo isto dos bailes de Carnavale dos Carros de cavalos enfeitados na rua das Palmeiras e arranjados na Junta Autonoma das Estaradas limbo do Sh.Luz e dos filhos, do Constantino e da Sofia que ainda eram meus primos, pela parte dos Penisgas bem como da vossa casa nos CTT e da tua Mae D.Corina e do Telefone dos correios com um serie de linhas penduradas com pesos, e de duas Senhoras que o atendian e passavam as chamadas (Ligacoes), uma delas encontrei passados algums anos ja nos 70 em Silves. Contudo e apesar da minha memoria ser boa, esta ja um pouco ofuscada.
Lembro-me de ti contudo vagamente, bem como da Casa dos Correios que dava para o Ze Padeiro a frente, e as trazeiras para a Rua de traz ,lembro-me tambem da Casa ter um sotao por debaixo dela e os muros atraz estarem a desmurunar. E muito mais do Viola electriscista e das suas filhas que davam Escola, se nao estou em erro, e a cisterna do Sofia ser a mesma do Viola, bem como me lembro do Salvador Alfaite e tenho uma vaga memoria do seu filho.
Dos Gavioes na Torre da Igreja Matriz e de um puto que ajudava a missa era de estatura pequena e ajudava o Ze Sacristao na Missa e respondia a mesma toda em Latin.
Lembro do Vinho de Missa que era excelente e quando o Ze Sacristao nao estava na Igreja nos faziamos as nossoa provas.
Do Licas do Forno do Julio que destrubuia pao com uma burra.
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