Fátima Mernissi, galardoada com o Prémio Príncipe das Astúrias, integra também o "Grupo de Sábios para o Diálogo de Povos e Culturas", seleccionados pelo Presidente da Comissão Europeia, Romano Prodi, para reflectir sobre o futuro das relações euro-mediterrâneas.
Por ocasião da recepção do prémio que atrás referi, pronunciou um discurso que gostaria de vos dar a conhecer, pela importância do seu apelo ao diálogo entre povos e culturas, tema da maior importância neste tempo em que os conflitos andam carregados de marcas étnico-religiosas por demais evidentes.
Usarei uma tradução tão fiel quanto os meus conhecimentos de castelhano e francês permitirem, cruzando versões, com a minha melhor boa vontade. Fá-lo-ei em vários posts, por vários dias, dada a extensão do texto, pouco adequada a este meio de divulgação.
O cowboy ou Sindbad? Quem vencerá na globalização?
1.- Porque temos medo dos estrangeiros? Porque tememos que nos agridam e nos façam mal. Temos medo do cowboy porque se um infeliz estrangeiro se aproxima das suas fronteiras, automaticamente saca dos revólveres. Ao contrário, não temos medo de Sindbad, o Marinheiro, porque nos contos das mil e uma noites, os quççaç (contadores públicos) contavam, na Bagdad do século IX, que a sorte de poder viajar até ilhas longínquas e comunicar com estrangeiros trazia prazeres e benefícios. Na civilização do cowboy o estrangeiro é sempre o inimigo, porque o seu poder e glória residem no controlo das fronteiras; na civilização de Sindbad, o diálogo com o estrangeiro é enriquecedor.
1.1- Sindbad é o contrário de um emigrante, pois regressa sempre ao seu ponto de partida - Bagdad. Nas suas sete viagens sai de Bagdad num barco, rio Tigre abaixo, até ao porto de Bassorá, donde então segue, quando a monção sopra de Ocidente para Oriente, a bordo de navios, repletos de mercadores árabes ou persas, que sulcam o Oceano Índico até aos portos das ilhas da Malásia, Indonésia e China. Sindbad e os mercadores que sobreviviam aos nufrágios ficavam nos portos asiáticos por seis a oito meses, esperando a estação do ano em que a monção fosse favorável, soprando de Este para Oeste. Mas Sindbad não era uma simples figura de ficção. Ele representava uma classe de mercadores de Bagdad que obtinha riqueza e prazer das viagens e da comunicação com os estrangeiros:
1.1.1.- (...)
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