Em noite de mudança da hora legal
Era tarde. Resolvi regressar.
Desci, compassadamente, a avenida sobre o rio, vendo partir alguns barcos para a faina do mar. As luzes de bordo reflectiam-se no negrume da água, sugerindo-me, na noite, uma qualquer fantasmagoria que me inquietou. Aproximei-me do carro. Olhei o meu relógio. Eram precisamente duas horas da noite. Abri a porta, sentei-me ao volante, coloquei o cinto de segurança e ia rodar a chave na ignição quando dei pela sua presença, sentada, a meu lado.
- Estavas aí? Como vieste?
- Ora! Resolvi vir ao teu encontro.
Beijou-me, longamente, e perdemo-nos em jogos de amor. Nem dei conta do tempo que ficámos ali, naquele rodopio estonteante, naquele nosso deslumbramento, naquela tranquilidade dos corpos saciados, naquele remanso doce do amor.
- Vamo-nos. Faz-se tarde.
Compus-me de novo ao volante, rodei a chave. No rádio o locutor informava:
«São duas horas da madrugada».
- Duas horas? Mas, eram duas horas quando...
Olhei para o lado. Ela não estava lá.Terei sonhado? Pareceu-me tudo tão real.
Ao chegar a casa consultei o meu relógio. Eram quatro horas.
Cerca de dez minutos depois chegava ela. Surpreendido, perguntei-lhe:
- Onde estiveste?!
- Onde estive!? Vieste tão apressado que nem deu para te acompanhar, ao longe.
- ?!?!?! Vim... normalmente... até demorei bastante.... parece-me.
- Deves ter demorado uma hora, mais ou menos.
- Só uma hora?
- Sim, uma hora. Pouco antes de chegar, o rádio, no carro, informava que eram três horas da madrugada.
- Mas no meu relógio são... Ah
quarta-feira, novembro 29, 2006
Um Conto (XXIII)
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9 comentários:
O tempo e os encontros e os encontros no tempo estranho este ir e vir este consultar relógios que são decerto alucinações e depois uma certa realidade tão pouco real quanto a moldura do sonho eu gosto dessa imagem com textura mourisca e depois tenho uma nostalgia imensa dessas terras do sul por onde andei e de onde vim e para onde o meu pensamento incessantemente me transporta... Boa noite António!
O tempo e um final que assume aquilo que na realidade um conto deve ser.
Muito bom.
Pôr-me em dia, com o sonho. Sempre um gosto velado, passar. Abç
Joana, Helena e Bet, fico reconhecido pelos vossos comentários.
Um abraço.
Como sempre, muito bem escrito.
Abraços.
CARO TÓY !
SEMPRE O SONHO A ACOMPANHAR-TE !...
BFDS (renovado)
JOÃO CARREIRA
Torquato e João
Aquele abraço!
Bem dizia o Mário Sá-Carneiro das saudades que tinha dos sonhos que não tinha sonhado!
Abraço.
Quem não as tem, my Lord!?
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