Günter Grass, o Nobel da Literatura em 1999, visita o Algarve, preferencialmente na Primavera e no Outono, há mais de duas décadas.
Entrevistado por ocasião de uma sua exposição de litografias, a ilustrar contos de Hans Christian Andersen, no Centro Cultural de São Lourenço, respondia assim a algumas questões da entrevistadora, Malin Löfgren:
(...)
- Acha que a região tem vindo a mudar muito desde que começou a passar aqui as suas férias?
- Sim, sem dúvida. Essa modificação começou depois da chamada Revolução dos Cravos, quando o país se abriu. E tivemos a esperança de que Portugal não copiasse os erros dos espanhóis. Mas, infelizmente, as pessoas tendem a repetir os mesmos erros. E assim construiu-se desmesuradamente ao longo de grandes extensões de costa. Também a paisagem se alterou com os numerosos campos de golfe, de uma forma que já não tem nada a ver com Portugal. Podia-se estar noutro sítio diferente. E esses campos de golfe são prejudiciais para a região, porque fazem gastar muita água. E isso faz descer sempre o nível dos lençóis de água subterrâneos. Como esta região, de tempos em tempos, tal como acontece presentemente, é ameaçada por secas, esta é uma maneira muito irresponsável de lidar com a terra. É de lamentar.
(...)
- Sendo uma pessoa com uma preocupação social, política e cultural, como descreve o seu engajamento?
- ... com a globalização, e paralelamente com o chamado neo-liberalismo, os Parlamentos, que são verdadeiramente os únicos órgãos eleitos em todas as democracias, têm sido, cada vez mais, despojados de poder. Na Alemanha, pode observar-se isto muito claramente e creio que noutros países também. A ingerência da economia, dos bancos, embora não estejam democraticamente legitimados, tornou-se tão forte que algumas decisões saídas dos Parlamentos se parecem mais com demonstrações de impotência. No fundo, este é o maior perigo que existe actualmente para a democracia. É que ela se transforme numa farsa. É que as pessoas se dêem conta que votam todos os quatro ou cinco anos, mas as decisões já não são tomadas nos Parlamentos, mas sim nos lobbys, nas sedes das grandes empresas industriais, de forma global, e que eles não passam de peões no jogo da economia. Este é o maior perigo para a democracia, desde que as ideologias foram desfeitas. Depois do fascismo e do comunismo ortodoxo, ficou o capitalismo como o último verdadeiro perigo, a ameaça, capaz de minar os fundamentos da democracia.
(...)
P.S.
Sobre o falecimento do Papa remeto-vos para um post que publiquei, em 7 de Outubro de 2003, sob o título Como os que escondemos... longe da vista....
3 comentários:
Gostei muito de ler hoje todo o teu post, P.S. inclusive
António, desculpa o preciosismo: a Malin é uma jornalista! Aliás uma excelente jornalista norueguesa do «barlavento». Um abraço do Helder.
Já corrigi.
Obrigado, Helder. Um abraço.
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