O silêncio que sai do som da chuva espalha-se, num crescendo de monotonia cinzenta, pela rua estreita que fito. Estou dormindo desperto, de pé contra a vidraça, a que me encosto como a tudo. Procuro em mim que sensações são as que tenho perante este cair esfiado de água sombriamente luminosa que [se] destaca das fachadas sujas e, ainda mais, das janelas abertas. E não sei o que sinto, não sei o que quero sentir, não sei o que penso nem o que sou. (...)
Bernardo Soares
Fernando Pessoa
Livro do Desassossego
Assírio & Alvim, Lisboa 2005
12 comentários:
Como (me) senti assim, também, neste fim-de-semana chuvoso! Embora feliz..., quanto pode ser o que é "sombriamente luminoso".
Um llivro que folheio frequentemente.
Manuel
Escolhi o texto precisamente pela sintonia com o meu estado de espírito; afinal também o teu, que descreves bem quando dizes «Embora feliz..., quanto pode ser o que é "sombriamente luminoso"».
Obrigado pela partilha, Helena. Também o folheio amiúde, por isso deparei com este silêncio do som chuva em sintonia com o meu. O plural do meu título pretende reflectir a singularidade da interpretação e do sentir de cada leitor.
Lindo :)
Bjx e boa semana
É, não é, Nadir!
Há dias assim...
Eu que o diga, sombriamente.
Um abraço,
RS
Ora quem, para se sintonizar com as sombras!?
Uma das virtudes da arte literária, neste caso, é trazer do fundo do artista o pasto de que nos alimentamos à superfície. Bem haja, António, pelo trazer de hoje.
Cumprimentos atrasados.francisco ricardo
Francisco
Não entendo porque são atrasados os cumprimentos, mas creia, sinceramente, que é sempre com muito gosto que o recebo nesta minha casa.
Um abraço.
É engraçado como em certos momentos tropeçamos em palavras que se transformam em espelhos onde nos vemos melhor. Foi o que me aconteceu agora. Obrigado António amigo. Saudades e muito afecto.
É verdade, fatma, as palavras contêm cargas emocionais que reconhecemos em situações da nossa vida.
Falas em saudades. Conhecemo-nos, porventura, ou é o afecto a falar?
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