Era já de tarde, na sexta-feira, quando me confrontei com um dos cartazes da iniciativa cultural da Câmara Municipal de Silves para o sábado seguinte:
- Ciclo de Jazz
Igreja da Misericórdia
23 de Outubro -21h30
Laurent Filipe - "Homenagem a Chet Baker"
Sinceramente, não estranhei que não tivesse visto nenhuma informação na imprensa regional, pois ultimamente Silves só é mencionada quando as iniciativas não são da Câmara Municipal (parece que não lhes interessa publicitar as suas actividades para o exterior).
Estranhei, isso sim, que esta iniciativa fosse publicitada na véspera do acontecimento, tanto mais quando se trata de um tipo de oferta musical que não é habitual e que, por tal motivo, necessitaria de uma divulgação com um prazo mais dilatado, a despertar atenções, a atingir públicos específicos, a promover o interesse.
Por aquele mesmo motivo estranhei o jazz e perguntei-me que tipo de público pretenderia a Câmara atingir. Mas, pensando bem, não é de estranhar, pois as programações da Câmara não aparentam nenhum critério definido; antes parecem correr um pouco na dependência da liquidez orçamental, ao sabor da oferta cultural do momento, ou por proposta de alguma empresa que recentemente por aqui tenha passado com as suas promoções de espectáculos.
Jazz na Igreja da Misericórdia? Estranhei. Não porque a Igreja não esteja desactivada para o culto e não seja frequentemente utilizada para diversos tipos de iniciativas, mas sim porque o jazz carece de alguma informalidade que se não coaduna com a arquitectura, a tipologia e o mobiliário daquela sala. Lembrei-me, então, que a Câmara Municipal não tem um único local que se adapte a qualquer tipo de espectáculo que mereça um mínimo de apresentação e conforto - e voltei a não estranhar.
Mas a Câmara patrocina praticamente todos os espectáculos da Fábrica do Inglês. Porque não o jazz na Fábrica do Inglês? Estranhei.
Mas, pensando melhor, como é um espectáculo que não convoca grandes multidões e se adapta a locais bem mais pequenos, talvez fosse ferir as susceptibilidades e os interesses dos proprietários de outros bares e locais de diversão da cidade, alguns dos quais já têm realizado sessões de jazz, mesmo sem o apoio da Câmara de Silves. E não estranhei.
Ainda me vieram à mente algumas instituições sem fins lucrativos, com salas aceitáveis, algumas das quais até ligadas à música, como a da Sociedade Filarmónica Silvense, e onde existe certamente um público conhecedor, que gostaria de apreciar artistas de qualidade superior à média, ou ainda o APARTE/Racal Clube, que o ano passado apresentou concertos de clarinete e guitarra, guitarra clássica, trompete, música coral e vem divulgando grupos ou artistas que compõem a sua própria música ou criam adaptações de outros compositores e que, ainda por cima, oferece condições bem próximas de um bom ambiente para um concerto de jazz. Mas não estranhei.
Não estranhei porque a Câmara - as Câmaras - são mesmo câmaras, isto é, salas, fechadas à iniciativa da sociedade civil, distribuindo subsídios e benesses para que, caladinhos, miseráveis e agradecidos não venham a ofuscar as "grandes" realizações camarárias.
Como se não competisse melhor à administração pública apoiar, propor e promover iniciativas, do que realizá-las.
P.S.
(1) - PARABÉNS a Asul , por ocasião deste aniversário blogal e pela iniciativa do encontro de bloggers algarvios.
(2) - A partir de hoje é possível aceder a um arquivo dos textos aqui publicados sobre Silves. Entretanto, o arquivo reporta-se somente aos textos de 2003. Um link para esse arquivo passou a constar na coluna de links, à direita.
Pode aceder aos textos agora, clicando aqui.
9 comentários:
Não estranhei este Post, aliás subscrevo praticamente a sua totalidade.É de facto verdade que não existem locais apropriados em Silves, propriedade da Câmara Municipal para a realização de eventos culturais. Quanto à programação cultural a mesma é o reflexo da realidade acima apresentada. A famosa frase " fazer omoletes sem ovos" diz tudo mas não explica.
também eu não estranho nada daquilo que está escrito neste post. enquanto aí estive a viver pouca coisa vi que fosse da iniciativa da Câmara Municipal. quanto ao APARTE/Racal Club: foi o que safou a situação, principalmente as noites de sexta-feira. e também entendo muito bem este post. cá em Manteigas também é de estranhar a falta de iniciativa da Câmara. mas, ao mesmo tempo, não é de estranhar:
A leitura do teu blog tornou-se uma necessidade absoluta para quem, como eu, se interessa por tudo quanto, directa ou indirectamente, respeita a Silves, nossa terra comum. O abraço de sempre.
Estranhar / já é aprofundar / Ora, graças a Deus, / alguém / parou na rua / e não perdeu / o jeito de olhar / pensar / estranhar / Será semente / que se formou / espalhou / germinou ? / (...)
(segue no comentário seguinte)
(continuação)
(...) Ou respiração boa / que se desprezou / invalidou / queimou / e da cinza / nem lenda preciosa / brotoeja / barafusta / na doce paz / dos dias brancos / a passar / e cada vez mais / "isto" a atrasar?
Sobre a falta de divulgação deste evento, posso acrescentar que até hoje não chegou nenhuma notícia ao Terra Ruiva. Soube que iria decorrer tal iniciativa por uns cartazes que ontem vi quando me desloquei a Silves. E na Voz de Silves, tanto quanto me lembro, pois ainda hoje folheei a última edição, também não consta nada.
E já agora mais um comentário: recebi hoje a agenda cultural da Câmara, para os meses de Outubro!!!! e Novembro.
Palavras para quê? É a competência!!!! E a falta dela!
Comentando apenas o PS (1):
Obrigado :-)
estranha-se o que se faz, o que não se faz, o porquê de e não fazer...e de facto chateia-me, faz-me mal e faz-me bem pior o não apoiar quem faz ou quem tenta fazer...faz-me mal saber que nem tentam saber o que se fez e o que se vai fazendo...afinal o que é que a câmara faz?!...quando por vezes mais valia não fazer para fazer aquilo que faz!
um abraço daqueles
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