Num dos primeiros dias do ano assisti, por um dos canais de cinema da televisão, a um filme cujo título não mereceu tradução para português, a não ser pela substituição do "and" por "e" - State and Main (cruzamento de duas ruas na cidade de Waterford, Vermont, EUA).
Àquela pequena e tradicional cidade americana chega uma equipa de cinema, procurando uma velha azenha para cenário do filme, que acaba por provocar uma alteração radical na vida dos seus habitantes: há alteração na oferta dos cafés e lojas adaptando-se à procura que os novos clientes impõem, a mulher do presidente da câmara altera a aparência da sua moradia para nela receber, num grande jantar, os famosos actores e cineastas, o grupo de teatro local deixa de comparecer aos ensaios porque cada um pretende um lugar como figurante, as meninas perdem-se de amores pelo actor principal, os políticos adaptam-se às circunstâncias, promovendo-se e corrompendo-se, e a "intelectual" do sítio, possuidora de uma livraria e de uma imprensa, apaixona-se pelo argumentista, de ar desastrado e ingénuo, que pretende recuperar no cinema a "pureza" da arquitectura tradicional de alguns edifícios e o modo de vida rural e pacato de uma pequena comunidade.
Terminado este enquadramento, para entenderem aonde quero chegar, quero lembrar-vos que este tipo de alterações, mesmo sem cineastas, foi ocorrendo, desde o início dos anos 70, por todo este Portugal rural e tradicional a que chamamos de provinciano. É o progresso, o desenvolvimento.
Mas, não é o progresso, nem o desenvolvimento, nem sequer o saudosismo de alguma quietude passadista ou o tradicionalismo regionalista que quero convocar. O que me ocupa a mente é antes o perguntar-me se existirá alguma relação entre o desenvolvimento e a perda de alguns valores que ainda considero importantes, mas que se vão cada vez mais diluindo num "pragmatismo" de conveniência e de oportunismo.
O jornal daquela terrinha, Waterford, tinha como lema "Não cometer perjúrio" e foi este, na minha modesta opinião, o tema principal do filme, em torno de um acidente de automóvel que ocorreu no cruzamento da State e da Main (streets) e dos testemunhos em causa.
Regressando ao nosso tempo, ao nosso lugar e ao que observamos e aqui comentamos amiudadamente. A honestidade, a responsabilidade e o respeito pela palavra dada, a ética profissional, serão valores em extinção, em conflito com o progresso e as mudanças inerentes? Queria perguntar ao sociólogo de serviço nos blogs - Socioblogue2.0 - mas ele tem andado muito arredio.
Será que alguém me quer esclarecer? Sinceramente, ficarei agradecido.
P.S. Solicitei aos autores dos blogs que referencio como de minha leitura diária um comentário ou debate sobre este tema. Faço-o agora também aos meus leitores habituais. Aguardo o esclarecimento.
terça-feira, janeiro 06, 2004
Honestidade e Pragmatismo
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10 comentários:
caro antónio aqui estou a responder à chamada embora de forma para já apressada devido a deveres porfissionais. as questões que levantas como sabes, não permitem uma resposta simples e directa. sem prejuízo de voltarmos a estes temas que são importantes, considero que estes "valores" que referes não se encontram em vias de extinção. Fazem parte da nossa natureza, do nosso património, arriscar-me-ia a dizer que integram a nossa identidade como pessoas individuais e como integrantes da comunidade.
Por outro lado, não me parece que seja fácil ou possível estabelecer uma comparação relativamente a outras épocas porque os próprios conceitos que referes têm evoluído com o tempo e têm-se adaptado às circunstâncias particulares de cada época . Hoje existe muito mais visibilidade para o mediático e é mais fácil exporem-se valores que contrariam os que referiste, quer como crítica quer até destacando-os positivamente como elementos de "ruptura" com o "tradicionalismo". De qualquer forma qualquer análise histórica demonstra que embora com uma presença determinante em termos de visibilidade pública os conceitos de honestidade etc... encobriam muita hipocrisia camuflada. para já é isto um abraço e continua a visitar-nos
Agradeço ao Tchernignobyl, do Blogue de Esquerda, o seu esclarecimento em resposta ao que lhe solicitei.
Um abraço.
Apesar de não se enquadrar completamente no teor deste post, indico este outro que já escrevi há algum tempo.
Caro amigo Baeta,
Eis-me chegado (enfim!) ao Porto e deparei com o e-mail contendo o desafio que aqui me trouxe. Em breve lhe darei resposta, ao desafio, fumando um Montecristo (cigarro, que de charutos não sou grande apreciador) em memória de uma das caricatas cenas de State & Main! A seguir, n'A Sombra.
:-)
Um abraço,
RS
Queria poder responder aqui... Mas escrevi três vezes mais do que o limite permitido... E três comentários é muito comentário... Espreitem o bekbekbek... Peço desculpa pelo incómodo.
Numa resposta sucinta:
Não são valores a que se dê visibilidade hoje em dia, mas não me parece que estejam em extinção. Claro que a tentação é a de não ter nenhum princípio porque eles geralmente se metem de permeio entre a o que nos parece ser a felicidade.
errata:
entre nós e o que nos parece ser a felicidade
Obrigado Mário. Hoje à noite, depois da meia noite para que o post não perca actualidade nas 24 horas seguintes, falarei da minha resposta à minha própria questão e tu, de certo modo, tocas precisamente nesse meu ponto de vista.
Best regards from NY!
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