Há dois anos atrás, em Outubro de 2004, divulguei aqui os poetas que em 1961 publicaram, em Faro, a revista Poesia 61, cujo título viria a identificar um movimento literário que deixou uma marca indelével na História da Literatura Portuguesa. Se efectuarem um clique em Outubro 2004, acederão a poemas de Casimiro de Brito, Luiza Neto Jorge, Fiama Hasse Pais Brandão, Maria Teresa Horta e Gastão Cruz (pela ordem cronológica de publicação aqui, no Local & Blogal), que figuram entre os mais reconhecidos poetas portugueses contemporâneos.
O poema que transcrevo hoje é de Fiama, que o dedica à memória de Luiza Neto Jorge, falecida, aos 50 anos, em 1989.
- Meus ecos de Luiza N.J.
No lambril branco da janela bate
a cortina franzida presa,
tecido leve que soerguido
revela os quintais sem arte,
as serras longínquas não verídicas
esbatidas no vento de sempre.
Cena também sempiterna,
que uma vez se vive outra se revive.
Aí, na aura da janela vívida,
deixou delineada a ceramista
a sua falsa e verdadeira imagem.
Pelos dedos feitas linhas e sílabas
são dela o retrato fiel e eterno.
Do barro frio, do odor das formas
e da substância e ideia
do que moldava, a ceramista pôde
verter o barro em verbo.
É o que vejo e penso nesta casa mortuária
que se abre branqueada para o pátio,
onde a luz se coa e ecoa e uma branca
poalha espessa trazida por ventos fortes
nos isola, encerra e de esplendor cerca
da ceramista e poeta o rosto,
agora não vivo, de que se desprende
a inteira alegoria da cerâmica e poesia,
oficiadas a contraluz intensa outrora
na minha casa viva que revivo.
Fiama Hasse Pais Brandão
Entre os Âmagos
OBRA BREVE
Assírio & Alvim, Lisboa 2006
P.S.
1. - Se tiver curiosidade por este movimento poético, "Poesia 61", pode consultar a História da Literatura Portuguesa, na Biblioteca Universal
2. - Para informação mais detalhada, consulte Cadernos e Catálogos da Poesia Experimental Portuguesa.
Sem comentários:
Enviar um comentário