quarta-feira, novembro 24, 2004

A cidade corticeira

Clique para ampliar - © Henrique Martins
Silves, anos 30

A História local não tem lugar no currículo escolar, salvo por iniciativa pessoal deste ou daquele professor de História, e o conhecimento do passado de qualquer localidade do nosso país restringe-se a um núcleo reduzido de estudiosos ou de curiosos.
Se o conhecimento da História local ou regional tem importância, então é importante que se reveja esta situação, de forma a que os currículos venham a incluir esse estudo, que mais não seja através de trabalhos de consulta das obras indicadas numa bibliografia de referência.

O que sobre a História de Silves mais facilmente chega ao comum dos cidadãos limita-se à ideia de que no passado "Silves foi conquistada aos árabes", Diogo de Silvese sobre a gesta da Expansão Portuguesa, creio ser possível assegurar que a maioria da população nunca ouviu falar de Diogo de Silves, o descobridor dos Açores, com direito ao seu reconhecimento por parte dos açorianos, homenagem na filatelia nacional, com nome de rua em Odivelas (vá-se lá saber porquê) e, penitencio-me se peco por erro, sem ter sequer uma simples placa toponímica na sua própria cidade.

Há, ainda, um outro período histórico de particular relevância, marcado no tecido urbano pela expansão da cidade para Nascente, patente na rua Cândido dos Reis, e em todas as cercas de fábricas abandonadas ou utilizadas em mais ou menos recentes urbanizações e requalificações: a Silves da indústria corticeira.
Essa Silves permanece ainda em toda a baixa da cidade e nos seus edifícios de maior porte, nos prédios oitocentistas que serviram todo o comércio local e até nos majestosos edifícios dos Paços do Concelho ou do Palacete Grade.
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Apesar da recente intervenção de requalificação urbana da baixa citadina e dos novos edifícios e bairros a nascente e poente da cidade, Silves mantém ainda, além da sua silhueta (que parece não sofrer alteração desde os anos 30, de acordo com as fotos), as características arquitectónicas e urbanísticas dessa época, mescladas com as benfeitorias da moda e os remendos do tempo.

Aproveito o blog para estabelecer a ligação a um trabalho de João Madeira (Mestre em História do séc. XX), publicado no nº 12 de O Mirante, Dezembro de 1997 (orgão da Associação de Estudos e Defesa do Património Histórico-Cultural de Silves), sob o título Da alvorada do século ao Estado Novo.
Terá acesso a breve informação estatística, referências à formação da Associação de Classe dos Corticeiros (edifício de dois pisos na Rua da Sé, onde estão instalados alguns serviços camarários) e da Cooperativa Operária "A Compensadora" (ainda em funcionamento), notas sobre a luta pela redução da jornada de trabalho das 12 para as 10 horas diárias, relato da greve de 1924, que registou um morto e vários feridos (fez agora 80 anos a 22 de Junho), e outro relato, mais alongado, sobre os eventos de 18 de Janeiro de 1934, a crise do anarco-sindicalismo e a emergência do PCP, ainda referências ao jornal Voz do Sul, com sede no local onde ainda hoje há uma tipografia, na rua 5 de Outubro.

P.S.

Foi com surpresa que vi o Local & Blogal ser considerado o Blog do dia.
"De e sobre Silves. Muito interessante e original pela constante referência às nossas raízes e tradições árabes", citando Gabriel Silva, em Blasfémias, um blog com uma média superior a mil visitantes por dia.
Obrigado!

Atenção! Já está online o 6º itinerário de Arthur Rimbaud.


6 comentários:

Anónimo disse...

Queria apenas acrescentar que se pode encontrar o nome de Diogo de Silves na toponimia das seguintes localidades portuguesas:

Anónimo disse...

Atalhada (Lagoa - S. Miguel), Azeitão (Setúbal), Charneca da Caparica (Almada), Esmoriz (Ovar), Leça da Palmeira (Matosinhos), Lisboa, Odivelas, Queijas (Oeiras), Quinta das Laranjeiras (Fernão Ferro - Seixal), Sassoeiros (Carcavelos - Cascais), ...

Anónimo disse...

... Vale Flores (S. Pedro Penaferrim - Sintra) e Vila Nova de Gaia.

Anónimo disse...

António, é bem merecida esta referência, pelo trabalho de divulgação que tens vindo a fazer, a despeito das ignorantes ausências da administração local, caso da Câmara, entenda-se. Abraço do Helder.

Anónimo disse...

Asulado, Vale Flores (S. Pedro Penaferrim - Sintra) é onde mora bastet!

Anónimo disse...

Há muito que me apetece ir a Silves por causa da evocação de Al' Muthamid e de como serão as ribeiras onde o califa parece ter vivido como todos deviam viver: conscientes dos prazeres deste mundo. E também a Lagos, por causa do mercado dos primeiros escravos que Azurara relata, uns quatrocentos anos depois, na Crónica dos Feitos da Guiné.